Obaluaê
Silêncio, Obaluayê está em terra..
Se morrer é Omolu, fazer a passagem é Obaluayê. Passagem essa que reduz o espírito do ser até que ele possa “voltar a vida” em outro corpo, nascendo de novo em outra encarnação. Assentado no sexto sentido da vida ou linha de Umbanda, o Orixá rege o fator transmutador. Junto de Nanã Buruquê Obaluayê atua no campo do saber evolutivo do ser, sustentando (auxiliando a dar continuidade) esse caráter e no caso de Nanã amparando seus desvios.
“O sentido da vida é o sentido da evolução.”
Orixá universal que faz par com Nanã Buruquê, a ele se atribui o mistério ancião. Obaluayê é a sabedoria do mais velho e emana de si o que de mais bonito alguém pode exibir: a compreensão da vida, do outro e do existir. Pai Obaluayê representa a sapiência, a calmaria e sua irradiação está fortemente ligada a linha de trabalho dos Pretos Velhos. Essas entidades que preferem o banquinho ao ficar em pé, que têm a fala mansa e baixinha e que se apresentam humildes até na forma de falar, confortam qualquer infortúnio e as poucas palavras se tornam – de maneira singular – o refúgio para os corações cansados.
Todo o padrão vibratório presente nesse arquétipo é força de Pai Obaluayê e Nanã Buruquê. É claro que existem Pretos Velhos que são regidos por outros Orixás, mas de uma maneira geral toda essa falange recebe as irradiações da linha da evolução ou da terra.
Universal e Cósmica
A atuação de Nanã e Obaluayê em nossa vida pode ser comparando ao funcionamento de um balão a gás, “quando a gente pensa em Obaluayê e Nanã Buruquê, virtude é o gás que faz o balão subir e os vícios são o contrapeso que puxam o balão para baixo. Obaluayê é quem enche o gás para o balão subir, Nanã é quem é ajuda a destruir esse contrapeso que puxa-o para baixo”.
Sincretismo
Em algumas regiões do Brasil 16 de agosto é dia de Obaluayê e isso ocorre em decorrência do sincretismo com São Roque. A história do santo católico conta, que em uma de suas peregrinações São Roque teve contato com vítimas da peste e mesmo correndo o risco de ser contagiado se prostou a ajuda-las.
Algumas partes do país sincretizam-no com São Lázaro comemorado em 17 de dezembro e que segundo o dogma católico foi amigo de Jesus, sendo que o mesmo chegou a ressuscitá-lo 3 dias depois que já o haviam considerado morto. Esse simbolismo ligado à morte que aproxima a figura de São Lázaro as mitologias e ao mistério de Pai Obaluayê.
Diversas lendas africanas, que são contadas até hoje pelos conhecedores dos itans, falam sobre Obaluayê e a relação dele com as doenças, principalmente as de pele. Nesse contexto achamos o nome que acredita-se ter provindo da cultura Jejê dado ao Orixá: Xapanã.
“Só Xapanã poderia ajudá-los a conter a varíola, pois só ele tinha o poder sobre as pestes, só ele sabia os segredos das doenças.”
Sendo assim, evoluir do estado de doença para a cura é mistério de Obaluayê. Como Orixá bi Elemental ele traz a estabilidade necessária para que a vida se
sustente e a transmutação para que não se paralise, por isso também Pai Obaluayê é considerado um Orixá terra-água, sendo que como terra ele gera de si a estabilidade e como água propicia a mobilidade dos seres. Seu campo de força é o cemitério e mais precisamente o cruzeiro das almas, onde acredita-se que por uma razão energética o lado esquerdo pertence a Omolu e o direito a Obaluayê.
Atotô Meu Pai! Silêncio porque Obaluayê está em terra
Xapanã é Obaluayê?
Mitos
Os mitos iorubás abordam em uma perspectiva africana aspectos da natureza, criação do mundo e dimensões da vida. Segundo o sociólogo e escritor do livro Mitologia dos Orixás, Reginaldo Prandi “os orixás são Deuses que receberam de Olodumare ou Olorum e em Cuba Olofim a incumbência de criar e governar o mundo”. Dentro dessa vasta mitologia existe uma diversidade de nomes que estão associados a alguns orixás conhecidos na Umbanda, e é em torno do estudo e posteriormente transformação dessa tradição oral para texto escrito que alguns estudiosos focam suas pesquisas. Nessa ambientação encontramos Lendas Africanas dos Orixás, do etnólogo e fotógrafo Pierre Fatumbi Verger e como hoje nos propomos a falar sobre Xapanã é em busca do seu significado e simbolismo que vamos explorar a literatura de Verger e Prandi.
De Xapanã a Obaluaê
“Xapanã nasceu em Empê, no território Tapá, também chamado de Nupê. Era um guerreiro terrível que, seguido de suas tropas, percorria o céu e os quatro cantos do mundo [..] Seus inimigos saíam dos combates mutilados ou morriam de peste” o mito descrito por Verger em Lendas Africanas dos Orixás reporta sobre a chegada de Xapanã ao território Mahi, em Daomé. Nele também é comentado sobre a saudação “Atotô“. Na lenda – temendo a ira de Xapanã – os habitantes da região prepararam oferendas e o reverenciam o guerreiro acabado de chegar encostando a testa no chão e dizendo: Totô hum! Totô hum! Atotô! “Respeito e Submissão”.
Já na literatura de Prandi encontramos um mito em que Xapanã abre um buraco na terra que tem como função libertar um rei de seus malfeitos, e assim ele restabelece sua saúde, curando-o da peste que o assolava. “Lá Xapanã foi chamado Obaluaê, o Senhor da Terra.”
Cada um dos mitos citados traz uma particularidade do Orixá Obaluaê relacionando-o com o nome Xapanã, traz também um fragmento de uma tradição oral, um recorte dos costumes de um povo ..
entre tantos outros sentidos. Como já explanamos em textos anteriores, os mitos não possuem compromisso com a história ou com acontecimentos reais, mas propiciam – para quem se permite – interpretações e compreensão de simbolismos e mistérios presente nas religiões que bebem dessa fonte.
“Antigamente os orixás eram homens. Homens que se tornaram orixás por causa de seus poderes. Homens que se tornaram orixás por causa de suas sabedoria [..] E lendas foram transmitidas de geração em geração, para render-lhes homenagem.”
Lendas Africanas dos Orixás, Pierre F. Verger
Em alguns mitos Obaluaê aparece também como Sapatá ou Omolu e em todas essas designações carregam entre si características em comum. Em algumas regiões.